quarta-feira, 31 de agosto de 2016

“Não Toqueis nos Ungidos do Senhor”

Textos do Antigo Testamento não
dão legalidade para que crentes da
era atual tomem promessas feitas
exclusivamente à Israel como se
fossem para a Igreja no tempo da
Graça. No que se refere à unção,
deve-se entender que antigamente
havia homens especialmente
separados para determinadas
funções, mas hoje os dons
espirituais abrangem a todos de
alguma forma, tornando-os
iguais em relação ao trabalho
ministerial. Assim sendo, o que
se deve é ter respeito pelos
lideres, mas não atitudes que
os coloquem em posição de
semi-deuses.
(1º Samuel 24:6) - E disse aos seus homens: O Senhor me guarde de que eu faça tal coisa ao meu senhor, ao ungido do Senhor, estendendo eu a minha mão contra ele; pois é o ungido do Senhor.   
    Esse versículo, entre outros (1º Sm 26:9; 2º Sm 1:14; 1º Cr 16:21,22), é usado literalmente por determinados cristãos - principalmente líderes - como ameaça quando se sentem afrontados por alguém. Dessa forma, tentam manter os demais coagidos sem direito a questionamento ou opinião própria. Existem crentes especiais? O que a Bíblia diz sobre isso?
    Observemos que a palavra ungido, nesse sentido, aparece apenas uma vez no Novo Testamento, nas versões bíblicas mais comuns, referindo-se ao próprio Jesus (At 4:26). Agora, vejamos o significado desse termo: sua origem está no verbo ungir, o que significa por azeite na cabeça de uma pessoa; é dessa forma que os profetas, sacerdotes e reis eram separados para suas funções em Israel. Tal ação era executada sob ordem divina, isso explica o grande respeito de Davi por seu inimigo Saul: ele não queira ser culpado por matar aquele que Deus havia permitido ser o rei daquela nação; pois, devido a essa unção, Saul não era uma pessoa qualquer. Além do mais, o próprio Davi havia sido ungido para reinar após ele; por isso ele compreendia que o melhor era esperar pacientemente pelo seu tempo (1º Sm 26:10,11). Deve-se observar ainda, que mesmo respeitando-o, Davi não perdeu a oportunidade de conversar com Saul e explicar a injustiça que o mesmo estava cometendo, fazendo-o compreender que estava errado (1º Sm 24:8-21).
    Trazendo para a atualidade, não há base bíblica para que qualquer crente comum ou líder ministerial “tome para si” a unção de Saul afirmando que ninguém tenha o direito de questioná-lo. O que a Palavra ensina é que devemos respeitar uns aos outros (Jo 13:34,35; Rm 12:9,10; Ef 4:32; Fp 2:3,4) e obedecer nossos superiores (Hb 13:7; 1ª Tm 5:17; Rm 13:1), mas não nos obriga aceitar seus erros (1ª Jo 4:1; 1ª Co 14:29).

terça-feira, 30 de agosto de 2016

“José Era Um Sonhador”

Muitos dizem que os sonhos que
Deus sonhou para você não vão
morrer; porém, a Bíblia não
ensina que Deus tenha sonhos
- pois sonhos podem falhar -,
mas sim propósitos.
Intencionalmente ou não, para
animar o ego humano, "reduzem"
Deus a um mero sonhador.
Gn 37:5,9a - “Sonhou também José um sonho, que contou a seus irmãos; por isso, o aborreciam ainda mais. 9E sonhou ainda outro sonho, e o contou a seus irmãos [...]”
    O simples relato bíblico desses dois sonhos que José teve enquanto dormia tem sido suficiente para que muitos pregadores, na intenção de animar seu público dizendo que seus sonhos serão realizados, o classifiquem como um sonhador. Mas o que é o sonho? E qual é a diferença entre sonhar durante o sono e isso se realizar e ser um sonhador? Definindo de forma bem clara, sonhos são uma série de cenas vistas durante o sono e tais imagens são incontroláveis pela mente do indivíduo, podendo, muitas vezes, ser apenas repetição de lembranças do que ele viu durante o período em que estava acordado ou reprodução de pensamentos que estejam ocupando sua mente. Nas Escrituras Sagradas, vemos Deus usando desse meio para entregar revelações a seus servos (Gn 20:3; Nm 12:6; 1º Rs 3:5; Dn 2:1 Mt 1:20). Por outro lado, em linguagem popular, ser sonhador significa almejar um futuro, ter desejos, traçar objetivos, viver de esperança; nesse sentido, sonhar é sinônimo de acreditar que seus melhores projetos se realizarão.
    José jamais sonhou ser governador do Egito e tampouco que sua família se encurvasse diante dele; isso sequer se passava por sua cabeça. A Bíblia não o mostra como um sonhador. Na verdade, apenas teve dois sonhos, os quais foram revelações de Deus mostradas figuradamente sobre o que aconteceria no futuro, acontecimentos esses que faziam parte do plano divino para livrar o seu povo e os próprios egípcios da grande fome que estava por vir treze anos depois. Objetivos de vida obviamente ele tinha, no entanto deveriam ser bem diferentes daquilo que o Senhor estava preparando para a sua vida. Assim sendo, não há razão para usar a figura de José como base ou promessa para dizer que Deus vai realizar os sonhos de alguém, pois isso apenas acontecerá se tais sonhos estiverem incluídos em seus propósitos (Rm 8:28).

domingo, 21 de agosto de 2016

Uma Lição de Deus Sobre o Significado do Chamado

Jonas 4:4-11

A lição de Deus vai
além de "puxões de
orelha". Muitas vezes
Ele permite a bênção
e depois a tira para
mostrar a nós
mesmos que nossos
interesses estão fora
do verdadeiro foco.
1 – Sendo questionado por Deus sobre suas atitudes (4:4)
    “É razoável esse teu sentimento?”; essa foi a grande pergunta que Deus lhe fez. Em outras palavras, Ele quis dizer: “você acha justo esse seu ressentimento?”, “você tem alguma razão para estar com toda essa ira?”. O que mais impressiona nesse ponto da história não são as sábias perguntas reflexivas de Jeová, mas sua paciência com um homem tão rebelde e teimoso que mesmo depois de quase ter morrido por sua desobediência, ainda se recusava a compreender o valor do perdão. Só mesmo Deus para entender e suportar o ser humano.
    Deus tem te corrigido? Então considere-se mais que feliz, pois somente aquele que Ele tem como filhos são signos de sua correção (Hb 12:6-8). Porém, melhor mesmo é viver em obediência e evitar motivos para correções. Uma coisa que provoca a ira do Criador é a falta de misericórdia de suas criaturas, pois Ele as criou para viver em harmonia na terra (Rm 12:17-20). A falta de paz e perdão entre os homens ferem seu caráter santo e mostram o quanto eles estão longe dEle (Tg 3:13-18). A paciência divina é realmente para nós um motivo de segurança, no entanto, ela tem limite e, não havendo arrependimento, sua justiça é implacável (Na 1:3a).

2 – Ignorando a realidade (4:5)
    Apesar de ouvir a voz do Senhor, continuava o profeta achando que algo aconteceria àquela cidade: saiu dela e fez uma cabana, sentando-se sob ela e se colocando a observar qual seria de fato o destino daquelas pessoas. É como se não acreditasse de forma alguma que Deus fosse mesmo tão bondoso a ponto de não aplicar sua ira contra os pecados outrora praticados por eles. O que queria Jonas? Sua missão já estava cumprida e não havia mais nada o que fazer ali. Mas tão grande era a dureza de seu coração que ele precisava ver de perto como se as palavras que já tinha ouvido não lhe fossem suficientes. Dessa forma o que ele conseguiu foi atrair para si a ira do Senhor.
    Quando não aceitamos aquilo que sabemos que foi Deus quem fez daquela forma, simplesmente estamos dizendo: “Senhor, tu não sabes o que está fazendo e eu não admito isso!”. Como portadores de uma missão tão especial, não podemos pensar que temos o direito de continuar sentados numa sombra aguardando a destruição dos ímpios dizendo que é isso mesmo que eles merecem. O cristão não deve olhar para o passado ou para o presente de seu próximo, ele apenas tem que pregar esperançoso de que o mesmo se arrependa e abandone o pecado (Mt 9:11-13). Muitas vezes queremos pregar e orar pelos “bonzinhos”, mas o que temos feito por aqueles que mais necessitam de ajuda por menos que a mereçam (Lc 6:27-36)?

3 – Se alegrando com o próprio bem-estar (4:6)
    Já que ele queria conforto enquanto aguardava a execução da sentença final contra aqueles pecadores, o Senhor resolveu colaborar com o santo profeta fazendo nascer uma planta - uma espécie de aboboreira -; afinal, seu ungido era digno de usufruir do melhor dessa terra. Nesse momento ele sentiu o refrigério e se alegrou extremante, certamente, imaginando que Deus estava realmente com ele e que seus pensamentos contra os ninivitas estavam certos.
    Sabe aquelas bênçãos que Deus nos permite ter, sejam elas a nível ministerial ou mesmo secular? Elas não significam nada! Pois coisas boas e ruins acontecem aos justos e aos injustos (Mt 5:44,45); portanto, o bem e o mal permitidos por Deus - considerando-se as exceções - não expressam recompensa ou castigo. Ministrações bem-sucedidas podem significar simplesmente a compaixão de Deus sobre os ouvintes e conforto material somente um teste contra o próprio mensageiro mostrando o quanto ele é egoísta. Quantas vezes fizemos algo pela Obra - tanto na Palavra como no louvor, nas contribuições, na execução de serviços gerais ou mesmo na administração - apenas visando nosso próprio bem-estar, sem nos importarmos realmente com o objetivo verdadeiro que é levar vidas ao conhecimento da verdade por meio daquele trabalho? A aboboreira pode até ter sido plantada por Deus, mas a cobrança contra o egoísmo daqueles que permanecem embaixo dela também será feita por Ele (Mt 24:48-51[1]).

4 – Recebendo um golpe em sua alegria egoísta (4:7)
    No dia seguinte, quando tudo parecia bem, a surpresa preparada para Jonas não foi nada agradável: o mesmo Deus que criou a aboboreira também enviou um bicho que a feriu e ela secou. Era a hora da grande lição. Ele precisava entender que ser israelita não significava ser superior aos demais e que todos, mesmo não sendo merecedores, necessitavam de misericórdia.
    Não devemos esperar Deus enviar um bicho para devorar nossa aboboreira; se queremos preservar alguma conquista, uma mudança de atitude, a qual começa por dentro (Rm 12:1,2,11) é necessária e urgente! Há coisas que dependem de nós, mas são consequências tanto das atitudes quanto das intenções em tudo aquilo que fazemos (Rm 14:5,6).

5 – Sendo duramente corrigido por Deus (4:8)
    E lá vem Jonas de novo com seu sentimentalismo: “melhor me é morrer do que viver!”; essa foi sua reação quando acordou de um desmaio causado por um vento quente vindo do leste. Aqui ele passa a agir como um menino manhoso, pois não se conformava em perder a bênção e receber o castigo. Mas a situação era muito séria, porque ele desejou a morte com toda a sua alma, ou seja, de todo o coração. Havia uma guerra dentro de si e seu oponente era o próprio Deus.
    A noite garante a sombra e tudo parece calmo, mas é o dia que vai revelar a necessidade da sombra; será que as mãos do Senhor permanecerão sobre nós ou fomos reprovados no teste (1ª Co 9:26,27; 2ª Co 13:5)? Aparecendo o sol, descobriremos se a aboboreira que Deus plantou ainda está sobre a nossa cabana, e é nesse momento que descobrimos se estamos sendo confortados ou corrigidos por Ele. Muitos são os crentes que não suportam a correção e desistem do cumprimento do chamado; e o pior de tudo isso é quando não percebem que sua reprovação está vindo do Alto e atribuem seus fracassos à igreja, à situação financeira ou à própria família. Essa guerra interna tem feito o coração de muitos se entregar à morte espiritual provocando grandes quedas, pois não há como permanecer de pé quando se combate contra o próprio Deus (At 5:38,39; 1ª Co 10:20-22).

6 – Questionando a Deus por não aceitar a correção (4:9)
    Pela segunda vez o Senhor lhe questiona se é justa a sua ira: a primeira havia sido pelo livramento dos ninivitas e agora era por causa de uma planta. Sua resposta foi se auto justificar confirmando sua razão de desejar a morte. Com essa atitude ele revelou três características negativas: não aceitava correção devido ao orgulho, não conseguia perdoar e era muito apegado a coisas materiais. Esses sentimentos meramente carnais eram o que o levavam a não admitir estar errado e querer que sua razão prevalecesse a todo custo.
    Você aceita correção? Você compreende e aceita o motivo de estar sendo corrigido ou bate o pé querendo ter razão de todo jeito? É normal a correção nos entristecer no momento (Hb 12:11), mas se essa tristeza nos levar a aceitar a morte, ou seja, o fracasso espiritual, isso significa que estamos fora do foco em que deveríamos estar. Antes de justificarmos a nós mesmos, devemos analisar se estamos realmente certos e verificar se não estamos caindo em pelo menos um dos três pontos negativos que costumam predominar nesse tipo de situação: o orgulho que leva à negação do erro, a incapacidade de perdoar e o apego às coisas materiais. De nada adianta insistir com Deus quando sentimentos humanos predominam dentro de nós (Tg 4:1-5).

7 – Sendo alertado pelo Senhor contra o seu egoísmo (4:10)
    Agora Jeová revela à Jonas explicitamente todo o seu egoísmo, apontando para sua falta de amor ao próximo e sua supervalorização a si mesmo. Afinal, o que era aquela aboboreira senão uma simples planta com a qual ele não teve trabalho algum e nem possuía grande importância, pois teve apenas algumas horas de vida? Sua compaixão estava com os valores invertidos.
    Aonde está concentrado o seu sentimento? Existe algo mais importante do que o propósito da missão que foi confiada a ti? Seus valores revelam seu compromisso com a Obra (Mt 6:19,20; Cl 3:1-3). Uma das coisas que mais desagradam a Deus é o nosso exagerado compromisso com nós mesmos, principalmente quando chegamos ao ponto desprezar a dor do próximo (Gn 4:9-12; Rm 12:15,21).

8 – Uma lição divina sobre a necessidade do amor e da misericórdia (4:11)
    Encerrando sua lição ao profeta, Deus se compara a ele mostrando a diferença entre ter compaixão ou amor por coisas banais e por pessoas necessitadas. Aqui Ele deixa clara a questão que, embora fossem pecadores, os ninivitas eram tão ignorantes a nível de não conhecerem os detalhes mais básicos da vida. Dessa forma o Senhor revela seu caráter de extrema bondade agindo compreensivamente, dando-lhes uma nova oportunidade. E essa extrema bondade compreensiva estendia-se à Jonas, o qual Ele poderia ter matado impiedosamente pelo simples fato de ter questionado sua soberana vontade e liberdade de ação.
    Lamentar as decisões divinas significa reprovar sua justiça desmerecendo seu amor pelos perdidos. Muitas vezes, somos tão intolerantes que não queremos saber o que levou alguém a errar e apenas esperamos seu castigo. Porém, felizmente, Senhor não vê como nós (1ª Sm 16:7; Hb 4:13) e não considera a ignorância humana (At 17:30). Se Ele reagisse sem misericórdia conforme o pecado do homem, não haveria que se salvasse sobre a face da terra (Rm 3:10-12). A imagem de muitos cristãos hoje reflete o que aprendemos nos 48 versículos desse livro: falta de misericórdia. Ainda assim, ele é citado pelo próprio Jesus Cristo como um sinal para Israel (Mt 12:39,40). Por isso, nos atentemos a todos os seus pontos, analisando o que devemos ou não devemos pôr em prática através das lições do profeta Jonas (1ª Ts 5:21).



[1]Conservo: Companheiro de outros servos.

sábado, 20 de agosto de 2016

Sinais de Descontentamento com o Chamado

Jonas 4:1-3

Se dispor a cumprir
um chamado significa
compreender que você
está a serviço de Deus
e não Ele a seu
serviço.
1 - Não aceitando a decisão divina (4:1)
    Mais de 120 mil pessoas haviam acabado de se converter e não mais sofreriam a ira do Senhor. Qualquer pregador em seu juízo perfeito estaria dando pulos de alegria. Mas Jonas não. Seus sentimentos pessoais ainda estavam acima de seu chamado e seu coração ainda não conseguia compreender a necessidade do perdão. Seu descontentamento era tão grande a ponto de ele ficar ressentido, aborrecido, irado, ou seja, a tristeza dominou seu ser interior. O que era uma mágoa contra um povo inimigo, sobre o qual ele esperava vingança, tornou-se numa reprovação à atitude do próprio Deus.
    Não são poucos os casos de pessoas muito usadas nas mãos do Senhor que por vezes se encontram descontentes com o resultado de seu trabalho. O que leva a isso é o fato que muitos possuem seus próprios conceitos de justiça tanto em relação ao próximo como a si mesmos. Muitos estão como Jonas: acham que sua pregação é para deixar o pecador consciente de que ele merece o inferno e torna-lo ainda mais culpado por sua condenação, e outros estão insatisfeitos em relação à sua própria condição como mensageiros, pois acham que deveriam ter uma vida mais confortável por estarem a serviço do Reino. Ambos os equívocos são inaceitáveis, pois, todos nós, quando erramos queremos ser prontamente perdoados (Mt 18:23-27), então, não querer o perdão dos demais pecadores é hipocrisia (Mt 18:28-35); e no que se refere aos nossos “merecidos” privilégios como ministros do Evangelho, começando pelo próprio Jesus (Mt 8:20), vemos pela vida dos demais personagens bíblicos que a Obra requer um grande esforço pessoal (2ª Co 12:10,15; Hb 11:36-38).

2 - Julgando por si próprio sem considerar a misericórdia de Deus (4:2)
    Aqui o profeta revela o porquê de sua fuga para Társis: de fato, ele não queria o perdão para aquele povo. Obviamente, é compreensível sua reação emocional como ser humano, pois milhares de seu povo haviam perecido nas mãos dos assírios; no entanto, como servo de Deus, ele demonstrou estar longe do seu santo caráter. Sim, devemos compreender também que ele vivia sob os ensinamentos da Lei Mosaica, a qual punia severamente aqueles que derramavam sangue. Porém, ainda assim, não tinha ele o direito de questionar com Jeová sua decisão de conceder àqueles cruéis sanguinários uma oportunidade de salvação, principalmente porque deve-se considerar que aquele povo não conhecia a Lei e agia na total ignorância. Mas o coração de um profeta ressentido não conseguia compreender e tampouco aceitar isso.
    Você já parou para pensar quantas vezes pode ter julgado por si próprio e desconsiderado a justiça divina? Muitas vezes, diante de um pecador, pregamos achando que ele não merece salvação, oramos achando que ele não merece cura, ajudamos achando que ele não merece ajuda, enfim, fazemos o bem achando que Deus está aguardando o momento de lhe dar seu merecido mal; mas será que nós próprios somos merecedores da salvação, da cura, de ajuda ou de qualquer tipo de bem (1ª Co 15:9,10)? Sem agir com misericórdia, também não alcançaremos misericórdia (Mt 5:7; 6:14,15).

3 - Decepcionado com os resultados do seu ministério (4:3)
    A situação estava tão séria que nesse ponto ele já começa a apresentar sinais depressivos: ele pediu a morte. Em seu interior, ele parecia não acreditar que havia sido usado por para levar salvação ao principal inimigo de Israel. Era algo tão terrível plantado em seu coração que ele parecia se sentir traído pelo próprio Deus. Sua vida e seu chamado profético não tinham mais sentido, pois ele acabara de ter sido um instrumento utilizado em favor daqueles que oprimiam a soberania de seu povo: aqueles que até então, pelo seu conhecimento, eram os únicos com o privilégio de ser a única nação escolhida por Deus.
    Seja qual for seu dom - ou dons - você se sente decepcionado com a forma como o Senhor te usa ou com os resultados do seu trabalho na Obra? Você já parou para pensar em dois detalhes? Quem te concedeu esses dons e a quem pertence a Obra? Pode o barro dizer ao Oleiro o que Ele deve fazer (Rm 9:20,21)? Não adianta traçarmos planos “profetizando” por nossa vontade própria o que o Senhor tem que fazer apenas porque acreditamos que isso é justo. Nossos pensamentos não podem compreender os insondáveis propósitos divinos (Is 55:6-9). O fato de sermos chamados filhos de Deus não nos torna superiores aos que vivem na perdição; por piores que eles sejam, temos nós a obrigação de desejar que eles alcancem a misericórdia (Mt 20:14,15; Lc 15:25-32). Uma das principais características de um mensageiro do Reino é a prática do amor (Fp 1:21; Mc 12:30,31).

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

O Fruto do Cumprimento do Chamado

Jonas 3:5-10

Todo trabalho tem um objetivo, e
na pregação do Evangelho não é
diferente; no entanto, o fruto do
cumprimento de pregar a Palavra
deve visar a salvação de almas e
não a satisfação pessoal.
1 - Colocando em prática a estratégia de Deus (3:5)
    Ao ouvir a pregação de Jonas, os moradores de Nínive não apenas deram crédito, como resolveram tomar a atitude de humilhar-se diante de Deus proclamando um jejum. Alguns comentaristas bíblicos argumentam que o porquê dessa reação positiva à uma mensagem tão dura foi resultado de uma estratégia de Deus, o qual fez uso da idolatria do próprio povo para alcança-lo. Os ninivitas eram adoradores de Dagon[1] - um “peixe-deus” bastante popular na Mesopotâmia e no leste do Mediterrâneo -; assim sendo, para seus seguidores, não seria difícil dar ouvidos à um homem que alguns deles teriam visto sair de dentro de um peixe. No entanto, é importante frisar que em Nínive não há praia e a Bíblia não relata o local exato em que ele foi lançado em terra; pelos mapas apenas podemos deduzir que ele foi deixado em uma das praias - das quais a mais próxima estaria há uns 600 quilômetros de Nínive - e viajado até lá de alguma forma para depois iniciar sua caminhada de três dias. Partindo desse ponto de vista mais lógico, a teoria de Dagon faz sentido caso algum ninivita o tenha visto tão longe saindo do peixe e contado essa história ao povo. Evidências a parte, o que importa é que de alguma forma Deus colocou sua estratégia em prática e seu propósito foi cumprido.
    A Palavra pregada por nós produz resultado não porque temos poder persuasivo para convencer alguém (1ª Co 2:4), mas sim porque o Espírito Santo se encarrega desse papel (Jo 16:7,8). Não existe importância que entendamos o porquê disso ou daquilo, mas somente a necessidade de que sejamos obedientes ao nosso chamado, apenas falando ou fazendo o que corresponde à nossa obrigação como mensageiros de Deus (1ª Co 9:16). O resultado não é um mérito nosso (1ª Co 3:5-7[2]; Jo 3:29-31) e o método de aplicação usado corresponde à capacidade que nos foi dada por Deus (2ª Co 3:4,5; Fp 4:13).

2 - Atingindo o nível mais alto da sociedade (3:6)
    Talvez o profeta não esperasse que sua pregação alcançasse o próprio rei de Nínive. Mais do que isso, provavelmente ele nem imaginasse que, caso o alcançasse, sua reação fosse tão positiva: de imediato ele se levantou do trono, tirou suas próprias vestes, se cobriu de pano de saco e sentou-se sobre as cinzas. Como homem, Jonas poderia estar esperando, caso a mensagem chegasse até ele, uma atitude de afronta de sua parte ou, na melhor das hipóteses, o desprezo. Porém, mais uma vez, ele contemplou as mãos do Senhor sobre seu ministério confirmando sua missão.
    O que você espera alcançar no cumprimento da tarefa à qual está responsabilizado a fazer? Um de nossos grandes problemas é que muitas vezes não acreditamos no resultado que pode ser atingido, nas pessoas que podemos alcançar; pois olhamos para a situação imaginando-a intransponível encarando pessoas de elevadas posições como inatingíveis. Isso se deve ao fato de não encararmos o chamado como algo divino, mas apenas como a execução de um trabalho comum com nossas próprias forças a ponto de não confiarmos em sua provisão enquanto o fazemos (Lc 9:3[3] [4]).

3 - Obtendo um resultado acima do esperado (3:7)
    O rei não somente creu e aceitou a mensagem como também resolveu tomar uma atitude radical: emitiu uma ordem para que todos os cidadãos, incluindo seus animais, oferecessem um sacrifício de jejum ao verdadeiro Deus. Os povos antigos tinham por costume sacrificar aos ídolos, então essa prática não seria uma grande novidade para eles; porém, a diferença é que dessa vez não se tratava de seguir um costume, e sim de mover o coração do Criador em busca de misericórdia.
    As mensagens que pregamos precisam ser infalíveis em seu objetivo. Se não houver resultado positivo, algo está errado e precisa ser mudado. Mas como ser infalível se somos sujeitos a errar em palavras (Tg 3:1,2)? Essa infalibilidade começa quando reconhecemos a total dependência do Espírito Santo em nossas ministrações (Mc 16:20). Quando admitimos que somos apenas mensageiros e nos colocamos na posição de servos, Ele age surpreendendo com resultados acima das expectativas (At 2:38-41).

4 - Sendo usado para mudar a história de um povo (3:8)
    A humilhação do povo diante de Deus ordenada pelo rei era acompanhada de uma ordem: “converta-se cada um do seu mau caminho e da violência que há em suas mãos!”. Não havia alternativas; não existia uma separação entre os que quisessem ouvir o profeta e se converter e os que preferissem continuar em pecado; a ordem de mudança era para todos. O efeito da Palavra atingiu diretamente o coração do rei, fazendo-o transmitir ao povo um sentimento de unidade, levando cada um a entender que as atitudes individuais fariam a diferença entre o bem ou o mal-estar coletivo. Naquele momento, o milagre se estendeu muito além da unção de uma boa oratória do profeta, chegando a mudar os próprios costumes populares.
    O efeito da Palavra que pregamos precisa mudar histórias, remover limites, renovar esperanças, restaurar sonhos, ampliar objetivos, renovar mentes, alterar sentimentos, quebrar tradições, refazer conceitos, enfim, transformar vidas. O Evangelho tem poder para transformar (2ª Tm 3:14-17); a nós cabe simplesmente fidelidade na exposição do conteúdo do que levamos ao povo (At 20:24; 1ª Co 15:58).

5 - Causando um avivamento espiritual por meio da pregação da Palavra (3:9)
    A pregação de Jonas surtiu o efeito que todas as pregações deveriam surtir: o arrependimento de pecados acompanhado pela esperança do perdão de Deus. Esse é o verdadeiro avivamento; eles não receberam aquela mensagem com festa, mas com tristeza ao perceberem a gravidade de suas maldades. O temor da ira divina os levou sentir a necessidade de mudança; eles não queriam perecer por conta de seus pecados. Eles haviam compreendido que somente uma vida de acordo com as virtudes espirituais ensinadas pelo profeta poderiam satisfazer o Todo-Poderoso, evitando sua fúria sobre eles, assim proporcionando-lhes uma esperança de salvação.
    O barulho causado no avivamento provocado pela autêntica pregação da Palavra não se resume em nossas emoções, mas se reflete num profundo desejo de mudança que nos leva a abandonar totalmente o antigo modo de viver (2ª Co 5:17). Não há verdadeiro avivamento espiritual sem arrependimento e abandono de pecados (Hb 3:2). Avivamento sem transformação consiste apenas em movimento passageiro (1ª Co 14:32,33) e sujeito a escândalos (1ª Co 36-40).

6 - Alcançando o grande objetivo final (3:10)
    A aceitação e a obediência à Palavra com sinceridade de coração despertaram a atenção de Deus com olhar misericordioso sobre eles. Observando suas obras, Jeová se arrependeu do mal que tinha dito que lhes faria. Mas Deus se arrepende? A palavra arrependimento não se refere apenas a correção de um erro, mas também à compaixão por alguém no momento de puni-lo por algo. Assim sendo, vemos a misericórdia de Deus acima de seu sentimento de soberania por amor àquelas almas que caminhavam para a perdição.
    A mudança da sentença de Deus mediante ao arrependimento do ser humano é inquestionável e prova que há êxito na pregação do Evangelho quando estamos verdadeiramente direcionados por Ele (Tg 5:19,20). Muitas vidas podem estar com seu destino selado à perdição devido aos seus pecados, mas quando cumprimos com seriedade nosso papel de mensageiros ensinando que há uma oportunidade condicional àqueles que estiverem dispostos a renunciar às suas maldades (Lc 9:23), pode sim haver conversões que resultem em resgate de pessoas que caminham para o abismo (At 16:30-33). O objetivo maior de qualquer ministração tem que ser a salvação de almas (1ª Co 9:22,23; 10:33).


[1]Dagon: Significa "Peixe". Considerado um deus da fertilidade pelos filisteus, era adorado em Gaza e em Azoto, onde havia um templo, o qual foi destruído por Sansão (Jz 16:23-30). Sua imagem era representada com rosto e mãos de homem e cauda de peixe.
[2]Apolo: Significa "Destruidor". Judeu de Alexandria, muito eloquente, instruído na fé cristã por Áquila e Priscila. Tornou-se poderoso pregador do evangelho em Éfeso e em Corinto (At 18:24-28; 1ª Co 1:12-13; 3:4-6; 16:12; Tt 3:13).
[3]Bordão: Pau grosso de arrimo (encosto); cajado (Is 36:6; Hb 11:21).
[4]Alforje: Em árabe: al-Hurj. Bissaco (dois sacos) de couro, com abertura entre os dois compartimentos, pela qual se coloca no arreio, na sela ou nos ombros.

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

O Cumprimento do Chamado

Jonas 3:1-4

O cumprimento de um chamado
implica no enfrentamento de
vários desafios que muitas vezes
aparentam ser muito maiores do
que nossa capacidade; porém, é
a convicção de que estamos sob
a misericordiosa Graça divina
que nos dá forças para encarar e
vencer qualquer situação.
1 - Experimentando a misericórdia divina (3:1)
    O pior já havia passado. Agora o profeta já estava a salvo em terra. Seria esse o momento para o Senhor lhe cobrar duramente por sua desobediência, mas “jogar na cara” o que fez por ele não era seu objetivo. Havia uma grande missão a cumprir e o escolhido ainda era ele. Imagina-se que o estado emocional de Jonas fosse uma grande mistura de temor e gratidão e, sendo uma pessoa que tinha pelo menos um pouco de juízo, não viraria as costas à voz de Deus novamente.
    Misericórdia é uma das palavras-chave na vida de cada crente (Lm 3:22,23). Se fôssemos tratados pelo Senhor da mesma forma que muitas vezes o tratamos, já teríamos sido fulminados. Ele pode até precisar de nós para determinadas missões, porém, precisar não significa depender, pois Ele tem inúmeros meios de cumprir seus propósitos e um deles é nos descartar definitivamente. Não somos exclusivos (Rm 11:3,4). Você já parou para pensar na importância do lugar em que ocupa e no grande privilégio que usufrui diante daquilo que foi confiado em suas mãos? Ele poderia estar usando outro, mas escolheu você e te proporcionará meios para isso (Jr 1:4-10)!

2 - Tendo o pacto renovado com Deus (3:2)
    O plano divino não havia mudado. A ordem ainda era a mesma: “Levanta-te e vai à grande cidade de Nínive e prega contra ela!”. Talvez esse fosse o temor maior do profeta, mas o seu “plano B” não excluiu o “plano A” de Deus. Certamente, apesar de não ser exatamente o que Jonas queria fazer, a sensação de alívio por estar vivo e ainda poder ouvir a voz do Senhor foi seu grande fator motivacional para não repetir o erro anterior desobedecendo-o.
    Deus sabe como trabalhar conosco. Seu amor nos constrange e, sem necessidade de imposições (Ap 3:20), nos leva a cumprir o que nos é proposto (2ª Co 5:14ª; Jo 21:17[1]). É óbvio que se Jonas resistisse à sua voz e definitivamente decidisse não ir (At 7:51), isso não impediria que Nínive ouvisse sua Palavra (Is 43:13), pois o compromisso divino, primariamente, é com a mensagem e não com o mensageiro (Mt 7:21-23). No entanto, o profeta arcaria com as consequências por sua desobediência (Mt 25:11,12,24-30).

3 - Aproveitando de uma nova oportunidade (3:3)
    Ouvindo esse segundo chamado, Jonas levantou-se e foi. Sabia ele que não seria fácil cumprir essa tarefa: o lugar era estranho, a fama de seus habitantes não era nada boa, a mensagem não possuía um conteúdo nem um pouco agradável e havia uma longa caminhada de três dias pela frente. Mas o que um homem dependente de Deus poderia fazer além de obedecer? Ele estava muito longe de casa e, provavelmente, sem condições de voltar; no entanto, creiamos que a razão de sua obediência tenha sido pela vontade de aproveitar essa oportunidade em razão do amor e da gratidão a Deus pelo seu livramento e não por falta de alternativa.
    O que te move a obedecer a Deus? Aproveitar oportunidades - principalmente quando se trata de uma imerecida nova oportunidade - é uma atitude própria de quem tem sabedoria e temor ao Senhor. Porém, há sinceridade em teu coração quando você diz “sim” para Deus (At 8:18-21[2])? Enfrentar terras estranhas, pessoas difíceis, mensagens indignas de aplausos e trabalhos exaustivos são tarefas para quem tem convicção de seu chamado e conhece o Deus a quem está servindo (2ª Tm 1:6-12). Se não for por amor - sem interesses secundários -, caso não haja arrependimento, o resultado é catastrófico (At 27:3-6).

4 - Cumprindo seu chamado (3:4)
    Ele não esperou terminar a viagem de três dias para descansar um pouco e depois se apresentar diante do rei, pedir a montagem de um palco e ter tudo preparado para sua grande preleção[3]. A missão era urgente e, logo no primeiro dia, enquanto caminhava, começou a pregar, assim sendo ouvido pelos que encontrava pelo caminho. A mensagem era forte. Não tinha como “amaciar” fazendo uso de técnicas de oratória para ser melhor aceito pelos ouvintes, os quais eram pecadores que necessitavam ser alertados quanto à necessidade de arrependimento. Assim prosseguiu ele até o fim, talvez, sem ter a certeza de que consequências pessoais isso pudesse lhe causar. 
    O que mais costuma nos atrapalhar no cumprimento de nosso chamado é o período de preparo que impomos à nós mesmos. Logicamente, é inquestionável que devemos sim nos preparar, no entanto, é necessário lembrar também que a própria Obra é uma grande escola e que as maiores lições são aprendidas na prática. Essa missão é urgente (2ª Tm 4:2[4] [5] [6])! Outro fator que também muito atrapalha é o receio de trabalhar com a verdade: nos preocupamos com a quantidade do que podemos perder diante do homem, assim desprezando a qualidade do serviço que estamos prestando a Deus. Qual é o valor da verdade? Esse valor é a diferença entre a salvação e a condenação dos vários “ninivitas” para as quais o Senhor nos ordena a pregar diariamente (Ez 3:18-21). Quer realmente cumprir seu chamado? Pregue sobre subversão[7] sem subverter o conteúdo da pregação (2ª Co 4:3-5[8]).


[1]Simão: Significa "Ouvinte". Na Bíblia aparecem nove homens com esse nome: 1) Pedro (Mt 4:18); 2) Iscariotes, pai de Judas (Jo 13:26); 3) O leproso (Mc 14:3); 4) Cirineu (Mt 27:32); 5) Curtidor (At 10:6); 6) Fariseu (Lc 7:40); 7) Mágico (At 8:9-24); 8) Zelote ou Cananeu (Mt 10:4); 9) Irmão de Jesus (Mt 13:55).
[2]Simão, o mágico: É um personagem bíblico com quem o apóstolo Pedro travou polêmica em Samaria (At. 8, 9-24). Além do livro bíblico dos Atos dos Apóstolos, o personagem é referido em outras obras ligadas ao gnosticismo. O texto bíblico narra o episódio em que Simão tenta comprar dos apóstolos o poder de operar milagres. Tal ato, considerado pecaminoso pela teologia cristã, foi denominado de simonia (ato de Simão), termo que define especificamente o comércio ou tráfico de coisas sagradas e espirituais, tais como sacramentos, dignidades, indulgências e benefícios eclesiásticos, e que estaria no centro das críticas e discussão que conduziriam à Reforma protestante no século XVI.
[3]Preleção: Palestra com finalidade didática ou educativa; aula, lição.
[4]Redarguir: Repreender, replicar, responder.
[5]Exortar: Animar, incentivar, estimular. Induzir, conversar. Advertir, admoestar, aconselhar.
[6]Longanimidade: Paciência. Qualidade de quem tem grandeza de ânimo. Benigno, complacente, indulgente, corajoso, generoso, paciente, resignado, longânimo.
[7]Subversão: Ato ou efeito de derrubar, destruir; ruína, destruição, queda. Perversão moral.
[8]Fábula: Lenda, conto. Composição, geralmente em verso, em que se narra um fato cuja verdade moral se oculta sob o véu da ficção. Mitologia. Mentira. Ficção, falsidade.

domingo, 14 de agosto de 2016

O Arrependimento da Rejeição ao Chamado

Jonas 2:1-10

O arrependimento se manifesta
trazendo angústia, a qual
proporciona um profundo
desejo de corrigir o erro
cometido; esse sentimento de
amargura é o que leva o servo
de Deus a procurar se
aproximar dEle por meio da
oração.
1 - Orando nas entranhas do peixe (2:1)
    A escuridão e um cheiro insuportável certamente dominavam o ambiente; as acomodações eram extremamente desconfortáveis e só o que se ouvia era o imenso barulho de água pelo lado de fora: o cenário “perfeito” para uma oração. Seu roteiro de viagem estava drasticamente alterado e, na condição de profeta, com certeza Jonas se perguntava “como foi mesmo que eu vim parar aqui?”. No entanto, não importa como tenha sido sua sensação de arrependimento, ela deve ter sido acompanhada pelo lamento de não ter feito o que era certo e, nesse momento, o que restava era orar para corrigir o tempo que foi gasto planejando uma viagem indevida, aplicando seu dinheiro pagando por aquela passagem e dormindo num momento em que poderia estar realmente orando.
    Quantas vezes esperamos que a escuridão e o mal cheiro da podridão de nossos próprios erros nos assolem, atormentando-nos com o barulho dos perigos lá fora, para então clamarmos ao Senhor que intervenha com sua misericórdia? Se orássemos mais antes das consequências, nos momentos de tormenta nossas orações seriam mais de gratidão do que por livramento (Sl 55:22; Mt 6:33). Um de nossos piores males é encarar a oração como um “disk-emergência” e não como uma conversa cotidiana entre Pai e filho. Quando entendermos isso poderemos ser livrados com antecedência ou, simplesmente, ter mais forças para suportar o desconforto das entranhas do peixe (2ª Co 12:7-9).

2 - Mantendo a fé em meio à angústia (2:2)
    O início de sua oração demonstra o tamanho de sua confiança no Todo-Poderoso. Ele podia ter suas falhas e defeitos, mas não há registro bíblico de que em algum momento ele tenha negado sua fé. O profeta ainda estava nas entranhas do peixe, mas tinha certeza da resposta divina. Em seu relato, ele descrevia aquele lugar como o inferno, só que mesmo naquele “inferno”, gritando em meio ao desespero, ele pôde ouvir a voz do Senhor. Aqui Jonas mostra que a confiança da resposta é a certeza da concretização do milagre. Ele havia pecado através da prática da desobediência, mas sabia que seu arrependimento poderia alcançar o perdão.
    Qual tem sido o conteúdo de suas orações? Com que certeza de resposta você tem orado? Geralmente, em momentos de angústia, diante de Deus temos duas reações: não oramos ou oramos sem fé. Porém, ainda que tenha errado, o crente que procura manter sua comunhão com Deus, independentemente do “inferno” em que esteja vivendo, sabe que seu grito - seu clamor - será ouvido e atendido por Ele (Lc 18:13,14), e crê também que qualquer acusação de pecado é apagada pelo poder do perdão (1ª Jo 2:1,2,12[1]).

3 - Reconhecendo a soberania divina (2:3)
    Ele sabia porque estava lá; essa afirmação deixa isso bem claro: “tu me lançaste no profundo no coração dos mares”. Dessa forma, ele reconhecia a soberania divina sobre a sua vida. Na sequência, cita ainda as correntes das águas que o cercavam e as ondas e as vagas[2] que passavam por cima dele. Essa narração da assustadora situação em que se encontrava, acompanhada do termo “tu me lançaste”, mostra a consequência de seu pecado e o peso das mãos de Deus que embora o estivesse livrando, fez isso de forma repreensiva.
    A melhor coisa, mesmo que a situação não esteja muito boa, é sabermos que o soberano Jeová está no total controle de nossa vida. De fato, muitas vezes, as águas nos cercam e suas ondas e correntes parecem que vão nos submergir; no entanto, não devemos nos esquecer que a razão de nossas queixas está em nossas próprias falhas (Lm 3:39) e que se Ele nos corrige é porque nos ama (Hb 12:5-8). Assim sendo, se a tua vida continua sendo preservada é porque ainda há um propósito a ser cumprido; apenas se acalme, continue clamando e espere o momento de se dispor a aceitar a nova oportunidade que te será concedida para cumprir sua missão.

4 - Preservando a esperança viva em meio à incerteza da vida (2:4)
    O profeta se encontrava nas profundezas do oceano, mas tinha uma convicção: mesmo lançado de diante dos olhos do Senhor, tornaria a ver seu santo templo. Isso significa que mesmo naquela situação aparentemente irreversível, ele tinha a esperança de uma oportunidade de sobrevivência, na qual ele tornaria a servir ao Senhor novamente. Essa dura experiência o levou a refletir e sentir a necessidade de fazer melhor tudo aquilo que ele havia negligenciado antes.
    Normalmente temos uma grande dificuldade em compreender e aceitar quando o Senhor nos permite cair nas “profundezas do oceano”; pois é muito mais fácil questionar a situação do que dizer “fui eu que errei, por isso estou aqui!”. Mas, a grande prova de arrependimento é quando nos sentimos lançados fora da presença do Senhor e lamentamos por isso, desejando, a todo custo, que seja mudada essa situação (Sl 51:9,10). As quedas, muitas vezes, não são para matar, mas para nos fazer enxergar que estávamos no caminho errado, concedendo-nos uma oportunidade de reverter nossos erros (Sl 37:23-25).

5 - Descrevendo a caótica situação à sua volta (2:5)
    Para chegar ao ponto de as águas envolverem seu corpo e até as algas[3] se enrolarem em sua cabeça, significa que ele já havia chegado ao fundo do mar. Muito provavelmente esse peixe se alimentava de algas e, no momento em que as engolia, seu ventre se enchia também de água; situação essa que, certamente, aumentava muito seu desconforto ali dentro.
    As consequências de nossos erros, muitas vezes, chegam a um nível tão insuportável que nos sentimos sufocados pelos problemas que enfrentamos. Quando percebemos que o peixe que nos engoliu está abrindo a boca, nos enchemos de esperança achando que vai nos lançar para fora, mas é apenas mais água e algas entrando por cima de nós, mostrando que estamos no fundo, bem longe da superfície. Nesse momento, quando nos sentimos cercados e enrolados pelos alimentos que sustentam nossos opressores, só o que nos resta é meditar na situação em que caímos; tal reflexão pode nos levar ao arrependimento e à um grande desejo de mudança (Sl 51:7-9[4]).

6 - Vivendo uma experiência de dependência total de Deus (2:6)
    Jonas não podia ver, mas podia sentir que estava na extremidade mais baixa da terra, conseguindo até compreender que passava pelas bases das montanhas, lugar esse em que o homem nunca havia estado antes. Sua angústia o fez sentir-se preso nas profundezas como se houvesse ali uma tranca. No entanto, sua esperança estava viva: ele permanecia crendo que o Senhor o livraria da perdição.
    As aflições podem nos levar à beira do desespero, fazendo-nos até mesmo sentir como se não mais houvesse saída; porém, elas têm seu lado positivo: aumentam nossa fé, produzindo em nós experiência (Rm 5:1-4). Descer aos fundamentos dos montes e se ver cercado pelos ferrolhos da terra não são uma experiência para a morte, mas sim uma prova de dependência em relação ao Todo-Poderoso (Sl 124:1-8; Rm 8:37).

7 - Reconhecendo que não há outra saída a não ser confiar no Senhor (2:7)
    O profeta estava de fato com suas forças desfalecendo, ou seja: sua morte se aproximava. Mas sua mente estava firmada no Senhor, isso o mantinha vivo. Ele orava. Suas orações restabeleceram sua comunhão com o Pai; ele podia sentir sua presença mesmo em meio à agonia física. Ele poderia ter se entregado achando que não haveria mais jeito e simplesmente esperar pela morte lenta e dolorosa que se seguia, mas não, pois ele sabia que, embora tivesse pecado, não estava abandonado.
    A saída pode até não ser visível, mas quando cremos que ela existe, nem mesmo o risco de morte é obstáculo para que desistamos da vitória. No entanto, existe um segredo e ele é essencial: a comunhão com Deus; por meio dela obtemos confiança, a qual expressa fé, e isso é agradável a Deus (Hb 11:6) e resulta em sua resposta (Mt 9:27-30). Porém, é ainda necessário ter em mente que não é apenas em momentos de aperto que devemos nos lembrar do Senhor, pois a comunhão constante pode evitar muitos males (1ª Ts 5:17,18; Lc 21:36).

8 - Pregando para si mesmo em meio à crise (2:8)
    Aqui ele parece analisar sua própria vida, refletindo sobre coisas desnecessárias que já haviam feito parte dela. Em algumas versões bíblicas, essas vaidades são interpretadas como a prática da idolatria, dizendo que quem as pratica está abandonando a misericórdia do verdadeiro Deus. Mais uma vez, isso mostra que ele compreendia que sua razão de estar ali era mesmo a desobediência. Nessa reflexão, ele ensinava a si mesmo o valor de se aproveitar as oportunidades diante do Todo-Poderoso.
    O que pode estar ocupando o lugar de Deus em nossa vida? Sempre dizemos que estamos libertos da idolatria e das vaidades de nossa vida, mas o que é idolatria e vaidade? Idolatria e vaidade vão além de imagens de escultura e do cuidado excessivo com o próprio corpo. Ambos os males são representados por coisas que não conseguimos deixar embora saibamos que não sejam edificantes e apenas nos satisfaçam temporariamente, se contrapondo ao que Jesus ensinou sobre renúncia (Mt 16:24-26). Pregue para si mesmo como para um pecador e analise se a Palavra fala contigo; essa autoanálise espiritual pode fazer a diferença para te arrancar das entranhas desse peixe. Não deixe que nada te afaste da misericórdia divina (Hb 2:1-3).

9 - O ardente desejo de fazer aquilo que devia ter feito antes (2:9)
    Ele sentiu a necessidade de oferecer algo ao Senhor. Mas o que oferecer naquela tão miserável situação? Talvez mal tenha lhe restado pedaços de suas roupas. A Bíblia não relata com exatidão, mas nos permite entender que ele ofereceu louvor[5] em forma de cântico dizendo “do Senhor vem a salvação”. Talvez ele não tenha cantado naquele momento, mas de alguma forma expressou esse ato de gratidão à Jeová, e comprometeu-se ainda a pagar um voto[6] a Ele como forma de sacrifício.
    Não deveria ser assim, mas, muitas vezes, é quando nos vemos submersos na angústia que reconhecemos a necessidade de gratidão e um grande desejo de oferecer algo ao Senhor. Mas o que oferecer quando não temos mais nada? Uma coisa é certa, sempre temos algo, pois oferta[7] não se resume em finanças. Seja um louvor por meio de cântico ou de alguma expressão de adoração ou até a utilização de algum dom ou habilidade que tenhamos em prol de sua Obra, isso já representa a entrega de uma oferta, um sacrifício (Sl 116:12-14). Se não podemos fazer algo no momento, até podemos oferecer um voto, mas não nos esqueçamos que isso é um compromisso diante de Deus e não pode deixar de ser pago (Dt 23:21-23), pois Ele não se agrada de sacrifícios de tolos (Ec 5:1-7).

10 - A prova do amor e da soberania de Deus, livrando e levando-o aonde Ele queria que fosse (2:10)
    Deus tudo contemplava naquela situação toda e, diante daquela oração, conduziu o peixe à terra e o ordenou que vomitasse a Jonas. Aqui podemos observar duas de suas características inquestionáveis: amor e soberania. Ele poderia ter entregue aquele profeta desobediente à morte e usado outro, ou simplesmente também ter desconsiderado a salvação dos ninivitas, pois os mesmos eram terríveis pecadores, mas, ao mesmo tempo que livrou Jonas da morte e levou a ele próprio ao cumprimento dessa missão, mostrou ainda que nenhuma circunstância o faria desistir de cumprir seu propósito de salvação com quem quer que fosse.
    Seja em relação aos que escolheu para fazer sua Obra (Jr 1:5), ou aos que precisam ouvir sua palavra (Jo 12:47-49), Deus tem um plano em cada vida e proporcionará meios para cumpri-lo porque Ele é fiel e não pode negar a si mesmo (Nm 23:19; 2ª Tm 2:13). Porém, a infidelidade é viva dentro de nós (Rm 7:15-20), a qual nos torna sujeitos à desobediência, deixando-nos vulneráveis a perder o que nos está destinado (1ª Co 10:12; Mt 26:41). Por essa razão, cuidemos para que naquele Grande Dia não sejamos cobrados por termos desonrado ao que o Senhor entregou em nossas mãos, sejam dons espirituais (Mt 25:24-30; 7:21-23[8]) ou a própria salvação (Hb 3:17-19).



[1]Propiciação: Ato realizado para aplacar a ira de Deus, de modo a ser satisfeita a sua santidade e a sua justiça, tendo como resultado o perdão do pecado e a restauração do pecador à comunhão com Deus. No Antigo Testamento a propiciação era realizada por meio dos Sacrifícios, os quais se tornaram desnecessários com a vinda de Cristo, que se ofereceu como sacrifício em lugar dos pecadores (Êx 32.30; Rm 3.25; 1ª Jo 2.2).
[2]Vaga: Onda.
[3]Alga: Planta que vive no fundo ou à tona de águas salgadas ou doces. As algas servem de alimentos para alguns tipos de peixe.
[4]Hissopo: Denominação comum às ervas ou subarbustos perenes do gênero Hyssopus, da família das labiadas, originárias do sul da Europa e da costa do Mediterrâneo ao centro da Ásia, com flores espiraladas em espigas bracteadas. Erva (Hyssopus officinalis) medicinal labiada, originária do sul da Europa, de folhas violáceas, altamente aromáticas e estimulantes, usada na fabricação de perfumes e licores. Planta que na purificação era usada para borrifar líquidos (Êx 12:22).
[5]Louvor: Ato de louvar. Aplauso, elogio, encômio. Glorificação. Expressão usada para se referir às músicas feitas para adorar a Deus.
[6]Voto: Promessa feita a Deus (Ec 5:4; At 18:18). Pedido a Deus (3ª Jo 1:2).
[7]Oferta: Ato de oferecer; oferecimento. Oblação, oferenda. Retribuição de certos atos litúrgicos. Dádiva. Promessa.
[8]Talento: O talento de ouro ou prata era a unidade de moeda romana para grandes quantidades de dinheiro. Ele foi introduzido na Grécia Antiga e depois adaptado para o sistema monetário romano. Um talento era igual a 60 minas, que, por sua vez eram equivalentes a 100 dracmas. Sabendo que uma dracma era igual a 4,5 a 6 gramas de ouro ou prata, um talento significava entre 27 a 36 quilos de metal. Estudiosos calculam que um talento hoje valeria no mínimo 1300 dólares (cerca de dois mil reais). Espiritualmente, os talentos representam os dons que o Espírito Santo nos concede e, na linguagem popular expressa as habilidades especiais de uma pessoa; era um termo muito usado pelos romanos para elogiar uma pessoa de valor.