Ir embora quando algo não está bem parece ser uma boa saída; porém, fugir de um problema e encontrar vários outros não é uma solução tão sábia assim. |
Acordar cedo, arrumar a cama, ajudar nos
serviços de casa, estudar, precisar dar explicações quando tirar notas baixas,
escutar reclamações, ter que dividir a televisão e o computador com os irmãos,
controlar o horário para chegar cedo quando sair e, se trabalhar fora, ainda
ter que ajudar financeiramente. É... Vida de solteiro dentro da casa dos pais
não é nada fácil não! Então, a mente começa a martelar aquela velha “solução”
estratégica: “Preciso arrumar um canto só
pra mim!”. Sabe o que eu tenho a dizer para quem pensa assim? “Parabéns!”. Isso mesmo. Só consegue
pensar em liberdade quem tem ousadia para tomar atitudes radicais e enfrentar o
selvagem mundo lá fora sem a proteção da família. É admirável a personalidade
forte de quem planeja sua fuga da “ditadura” dos pais, porque certamente ele tem
condições para cumprir com todas as responsabilidades que surgirão e ainda terá
tempo para estudar, fazer comida, lavar roupas, limpar a casa, e ainda
conseguir curtir a vida sossegado, afinal, agora a TV e o PC são só dele e,
além do mais, ele também pode sair e voltar na hora que quiser sem ter que dar
satisfações a ninguém; pois agora é tudo só dele assim como também o
dinheiro... O dinheiro? Opa! Peraí! O dinheiro vai dar pra tudo isso? Parece
que além do tempo necessário para se cumprir com as obrigações normais, ainda
encontramos aqui um outro “probleminha” bem mais sério: suprir as necessidades
financeiras da “liberdade” - aluguel,
água, luz, telefone, cartões de crédito, etc. e muitas outras etc’s... -
não é a mesma coisa que dar uns trocados em casa uma vez por mês sabendo que os
pais vão bancar o restante sem te cobrar nada. E agora? Será que não é melhor
repensar seus conceitos de liberdade?
Só pra ajudar a reforçar seu raciocínio
enquanto decide, vou te contar a história de um jovem na Bíblia que também
pensava igualzinho a você e um dia resolveu sair de casa. Sim. É dele mesmo que
estou falando: o filho pródigo[1] (Lc 15:11-32[2] [3] [4] [5])!
Apesar de ser apenas uma ilustração, essa história contada por Jesus nos dá uma
clara noção sobre as desvantagens e os perigos de tentar se aventurar fora de
casa sem estar preparado para isso. Vejamos apenas dez das muitas lições que
podemos aprender com os erros desse rapazinho cabeça dura:
1 - Falta de sentimento
afetivo:
Ele tinha um pai, provavelmente uma mãe, e
um irmão, mas não se importou com eles e quis se distanciar do seu lar.
O desapego à família já é um sinal de que
algo não está bem, pois o convívio familiar é um dos princípios bíblicos de
maior valor para os servos de Deus, devendo ser interrompido apenas pelo
casamento (Gn 2:24; Mc 10:7). Qualquer outra
razão que te faça ter vontade de sair de casa como, por exemplo, a autoridade
dos pais ou a simples vontade de curtir a vida, deve ser encarada como um
problema e não como uma solução porque a desagregação familiar nada mais é do
que mais uma ação maligna para oprimir o ser humano (Tg
3:14,15[6]).
2 - Interesse pelo
dinheiro:
Ele poderia ter
saído sem nada, com a intenção de arrumar um emprego, mas demonstrou que o mais
importante eram as posses da sua família.
A cobiça tem sido uma das maiores razões de
desentendimento entre pais e filhos e entre irmãos. Muitos, mesmo sem sair de
casa, demonstram uma preocupação tão grande pelos bens materiais que excedem ao
zelo e evidenciam seu caráter egoísta; isso fica bem claro ao exigirem sua
parte ou seus “direitos” em tudo sem se importarem com seus irmãos e com o
quanto aquilo possa ter custado aos seus pais. Pensar em si mesmo mais do que
nos outros é um sentimento de indiferença que precisa ser combatido e
substituído pelo sentimento de amor, o qual nos leva a querer ajudar e dividir
o que temos em vez de somente usufruir daquilo que parece termos direito (Fp 2:3,4).
3 - Desrespeito pela
hierarquia familiar:
Tradicionalmente, a
herança só é dividida após a morte dos pais, com exceção de quando os mesmos
decidem entregá-la ainda em vida. Tomando a iniciativa de pedi-la antecipadamente,
ele agiu de forma desonrosa em relação à autoridade de seu pai e à
primogenitura do irmão mais velho que, em caso de necessidade, era quem teria
por direito fazer a solicitação da divisão dos bens.
Passar por cima da autoridade de alguém - principalmente do pai - e ferir os
direitos alheios é uma grande demonstração de arrogância e rebeldia. Nesse
caso, vemos também uma certa falha do pai, o qual podia lhe ter negado esse
pedido absurdo e deixado bem claro que se ele quisesse sair teria que ir sem
nada; dessa forma, muito provavelmente, como na maioria dos casos, ele
desistiria de ir embora porque não poderia executar seus planos supérfluos sem
dinheiro. O mal de muitos pais é não saber diferenciar entre amor e falta de
autoridade e, por dó de corrigirem duramente, muitas vezes acabam contribuindo
com o pecado e o futuro sofrimento dos filhos e deles próprios. Assim como a
obediência dos filhos, a autoridade paterna não é uma opção, mas uma determinação
divina (Cl 3:20,21).
4 - Falta de
responsabilidade:
Ele desperdiçou
tudo o que tinha, sendo que, mesmo que quisesse se divertir, poderia ter feito
isso moderadamente guardando uma parte para investir em algum negócio próprio
ou, pelo menos, deixando alguma reserva para ter com o que se sustentar até
conseguir um bom emprego, se casar e viver tranquilamente.
Essa é uma característica bastante comum em
muitos desajuizados: apenas se divertir como se a vida fosse um belo mundo
encantado cheio de fantasias. Ao sair de casa, ele não considerou o fato de que
a partir daquele momento não podia mais contar com o apoio do pai e que os
valores financeiros que levava nos bolsos eram a única coisa que ele tinha,
sendo assim necessária uma boa administração, pois seu futuro era incerto. Agir
com prudência é um ato de responsabilidade obrigatório para não sofrer no
futuro (Lc 14:31,32).
5 - Excesso de
confiança na estabilidade:
Certamente ele
achou que sempre haveria recursos ou empregos no lugar aonde estava. Quando uma
grande crise atingiu aquela região, ele não tinha mais dinheiro sequer para
procurar um lugar melhor.
Estar preparado para tudo não é paranóia[7]
de pessimistas como pensam alguns, mas sim uma prova de sabedoria e sensatez;
isso porque a pessoa sábia tem ciência de que não existe estabilidade no mundo
que vivemos e a pessoa sensata tem maturidade suficiente para entender que o
que ela possui não vai durar para sempre. É óbvio que devemos ter nossa
confiança centralizada em Deus, mas ignorar a possibilidade de perdas não é
sinal de fé e sim de irracionalidade por estar colocando à prova a misericórdia
divina (Lc 14:28-30).
6 - Tentar remediar a
situação para não encarar a vergonha da volta para casa:
Recorrer à família
depois de tê-la abandonado não fazia parte de seus planos, então o jeito era
tentar sobreviver a todo custo ainda que isso significasse sujeitar-se a
enfrentar situações para as quais ele não estava preparado como, por exemplo,
apascentar porcos.
A princípio, reconhecer um erro parece ser
um simples ato de se expor à humilhação, e é esse sentimento de orgulho que
provoca o aumento do sofrimento numa situação que poderia ser facilmente
resolvida. Não querer mudar de atitude expõe a pessoa a situações ainda mais
humilhantes e castigadoras do que o pedido de perdão e o conserto do erro. Para
muitos, principalmente os jovens, o orgulho é um grande inimigo que precisa ser
combatido com a convicção de que a maior dignidade está na humildade de admitir
as falhas e não na arrogância de querer mostrar que está sempre certo (1ª Pe 5:6,7).
7 - Despreparo para
enfrentar trabalhos difíceis:
O único emprego que
conseguiu, além de estar fora de suas condições de exercê-lo e de não ser muito
agradável, parecia não ter uma remuneração muito justa, pois ele não tinha nem
mesmo o que comer.
A Bíblia não relata, mas a situação nos
leva a supor que ele era um filho mimado, criado com excesso de liberdade, não
muito aplicado aos estudos e nem ensinado a exercer serviços mais duros. Esse
despreparo, no momento de dificuldade, o levou a sofrer porque ele não
encontrou nada para fazer que estivesse à altura de sua capacidade; além do
mais, o fato de estar trabalhando num lugar aonde não tinha nem o que comer,
evidencia um certo descaso por parte de seu patrão e uma falta de habilidade ou
conhecimento de sua parte para lutar pelos seus direitos. Isso reflete a mais
pura realidade em que vivem muitos de nossos jovens: descaso com os estudos,
desinteresse pela qualificação profissional, desconhecimento sobre as leis e
falta de argumento para se defender quando é injustiçado. Muitas coisas que
passamos são conseqüências do despreparo no passado; a construção do futuro
depende bastante do planejamento que é feito hoje (Pr
24:27).
8 - O abandono das
pessoas próximas:
Todos ali sabiam da
situação, mas ninguém lhe dava nada. Talvez essas mesmas pessoas tivessem se
divertido com ele quando estava cheio de dinheiro; porém, no momento de necessidade,
lhe viraram as costas.
Sabe aqueles amigos que sempre te convidam
para baladas, pizzaria, passeios, festinhas e as vezes até mesmo para eventos
de igreja, mas que sempre fazem questão de lembrar que tem que levar grana pra
“rachar” conta? Quer saber se eles são teus amigos de verdade? Diga que está
doente ou que não tem dinheiro... Quantos será que vão te oferecer ajuda ou
continuar andando com você? Muitas vezes nos decepcionamos por achar que
podemos contar com todos que aparentam estar ao nosso lado, por isso é
essencial ter um certo discernimento para poder selecionar bem as amizades e,
mesmo assim, ainda estar preparado para encarar possíveis desilusões (Pr 19:4,7).
9 - A lembrança do
conforto do lar na hora do aperto:
Apenas na hora de maior
sofrimento, não havendo mais condições de enfrentar sozinho a situação,
“lembrou-se” da confortável casa do pai.
A coisa apertou, todas as possibilidades de
saída já estavam esgotadas, então não tinha outro jeito a não ser suportar a
vergonha e ir bater à porta da casa do pai torcendo para ele ter misericórdia e
aceitá-lo de volta. O interessante é que nessa hora ele se lembrou de Deus
também - porque confessou ter pecado
contra o céu -, o que mostra que ele foi criado num lar religioso. Muitos apenas
se lembram da família e do próprio Deus apenas quando os problemas aumentam e
eles percebem que não têm mais como resolver sozinhos. Esse é um dos maiores
exemplos da hipocrisia humana e é uma das razões pelas quais o Senhor permite
tanto sofrimento ao homem; muitas adversidades que passamos são apenas
oportunidades para que reconheçamos nossos erros, peçamos perdão e mudemos de
atitude. Lembrar das bênçãos que já alcançamos e desperdiçamos, do chamado, das
promessas e dos livramentos que já tivemos, muitas vezes, nos levam a renovar
nossas forças e ter esperança para seguir em frente. Porém, melhor que isso é
lembrarmos sempre de Deus, para não termos que implorar sua misericórdia nos
momentos de maior sufoco (Jn 2:1,2).
10 - A humilhação de
voltar atrás e pedir perdão:
Não tendo outra alternativa,
tomou a difícil decisão de enfrentar a vergonha se humilhando e, admitindo que
errou, pedir para voltar à mesma família a qual ele tinha abandonado.
Há situações embaraçosas que somos nós
mesmos que criamos. É inegável que foi nobre sua atitude de se reconciliar com
a família, mas toda essa amarga experiência foi fruto de sua própria
negligência para com ele mesmo. Ainda que tenha sido recebido de braços abertos
pelo pai, isso não significa que ele não tenha sofrido as conseqüências de seus
atos, pois, como podemos ver adiante, teve que enfrentar a rejeição do irmão
mais velho e, certamente, a discriminação das demais pessoas que não mais
podiam confiar nele como um homem responsável e digno de respeito, o que pode
também tê-lo levado a ter dificuldades para conseguir um casamento porque os
pais daquela época - como os de hoje
também - observavam muito a capacidade e o caráter de um rapaz antes de
aceitá-lo como noivo de sua filha. Ser jovem numa sociedade como a nossa já não
é fácil devido à má fama que a juventude atual carrega e, se der motivos então,
torna-se quase impossível conquistar novas oportunidades. Há feridas que até
são curadas, porém, as cicatrizes ficam e denunciam a existência daquele mal
que, mesmo não mais estando ali, levam muitos a te ver alguém que não tem uma
saúde perfeita. É importante preservar a integridade, pois ela é um dos poucos
valores que nos levam a sermos avaliados pelo que somos e não pelo que temos (Pr 28:6; 16:8).
Como vimos, o abandono de um lar, ainda que
pareça ser por motivos justos, causa irreparáveis transtornos que vão muito
além do prejuízo material. Por isso, quando seus pais reclamarem de suas
atitudes, antes de se revoltar, lembre-se que eles querem o seu bem e que, com
toda certeza, a razão dessa reclamação não está na rabugice deles e sim em
algum erro seu que estão corrigindo para que você próprio e nem eles venham a
sofrer depois. Se, por ventura, forem injustos, lembre-se também que ninguém é
perfeito e que cabe a você reagir com respeito e pedir sabedoria a Deus para
que te dê graça para lhes mostrar o porquê de sua razão e juntos chegarem a um
acordo razoável para ambas as partes. Também não é necessário se culpar por, em
alguns momentos, achar a vida dentro de casa entediante e ter vontade de sair,
pois você é um ser humano normal e sua adrenalina pede isso. No entanto, busque
satisfazer essa necessidade de diversão de uma maneira saudável colocando
sempre em primeiro lugar o amor a Deus e à sua família, pois, sendo infiel a
eles, você estaria jogando fora sua própria salvação e causando dores
irreparáveis naqueles que te amam. E uma outra coisa que você pode ter absoluta
certeza é de que quando tiver seus filhos, você tentará controlá-los da mesma
forma e também sofrerá quando eles te desobedecerem. Você quer que a sua casa
seja um lugar melhor? Então comece por você mesmo sendo um filho melhor, um
irmão melhor, um vizinho melhor, um namorado melhor, um aluno melhor, um
funcionário melhor, um crente melhor... enfim, uma pessoa melhor para depois
poder esperar que todos a sua volta, principalmente seus familiares, sejam
melhores para com você (Lc 6:31; Jo 13:15). Um
bom meio de convívio é construído por nós mesmos através da nossa boa
convivência com o próximo. Quer conquistar um bom casamento constituindo um lar
abençoado? Então seja uma bênção desde já para ser digno de colher bons frutos
quando você for o chefe da casa. Valorize sua família enquanto ainda a tem;
melhor é o desconforto das cobranças do que um dia sentir a dor da saudade e do
remorso por lembrar que não foi um bom filho e agora não há mais como voltar
atrás. Quer independência? Então ganhe sabiamente a confiança dos seus pais
pelas suas boas atitudes; agindo assim, não só obterá boas experiências, como
também sempre terá um lugar de honra entre os seus (Tg
3:13,17).
[1]Pródigo: Que despende com excessiva
profusão; que desbarata os seus bens; dissipador, esbanjador, gastador,
perdulário. Que distribui, faz ou emprega com profusão: Pródigo de elogios.
Generoso, liberal. Aquele que gasta e destrói desordenadamente seus bens,
reduzindo-se à miséria. Pessoa que por sua prodigalidade se torna incapaz de
administrar seus bens.
[2]Fazenda: Riquezas e bens; Finanças.
[3]Dissolutamente: Desregradamente:
sem regra; sem controle, sem limites. Com lascívia, perversão, imoralidade.
[4]Bolota: Alfarroba (vagem
grande produzida pela alfarrobeira. Sua polpa, doce e nutritiva, é usada como
alimento para animais, inclusive os porcos).
[5]Cevado: Animal engordado
(Lc 15:23).
[6]Faccioso: Seguidor de uma
facção. Parcial. Sedicioso. Perturbador
da ordem. Causador ou defensor de rebeliões ou confusões.
[7]Paranoia: Psicose
caracterizada por um conceito exagerado de si mesmo e ideias de perseguição,
reivindicação e grandeza, que se desenvolvem progressivamente, sem alucinações.
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