sábado, 16 de janeiro de 2021

Existe Autoridade nas Palavras para Amaldiçoar?

Até que ponto nossas palavras podem influenciar espiritualmente
na vida de alguém? Independentemente de nossas palavras
surtirem efeito ou não, a intenção do nosso coração em relação 
ao nosso próximo já basta para sermos justificados ou 
condenados diante de Deus.
            Independentemente de uma maldição proferida contra alguém incluir “herdeiros” ou não, uma grande pergunta que nunca se cala é: “Palavras de maldição ou simplesmente de teor negativo faladas por qualquer pessoa podem surtir efeito?”. Dentro de um contexto geral, seja no meio religioso ou não, estamos cercados por pessoas que vivem apavoradas, sempre repreendendo outras à sua volta quando escutam palavras de conteúdo negativo, quando estas são proferidas em momentos de raiva, medo, tristeza, incertezas ou mesmo por brincadeira. Muitos, inclusive de outras religiões, sempre alegam que palavras negativas atraem más energias e que palavras positivas proporcionam um “ambiente iluminado”; e, entre os cristãos, o que muito se ouve é o constante uso do nome de Jesus para repreender qualquer comentário que lhes pareça contrário, seguido do argumento que se deve “profetizar” coisas boas para que as bênçãos aconteçam. Então eu pergunto: “Não seriam as atitudes mais poderosas do que as palavras? Quem garante que dizer coisas boas ou ruins faz com que as mesmas aconteçam?”.

Antes de dar respostas à todas essas perguntas, vamos analisar biblicamente observando em que tipos de situação tais palavras surtiram efeito. Nossa grande preocupação em estudar tal assunto à luz das Escrituras Sagradas é o fato de que essas práticas têm dado origem à verdadeiras doutrinas em muitas igrejas, entre elas a conhecida “confissão positiva”. Como bem sabemos, toda forma de ensinamento apresentada como Evangelho deve ser devidamente julgada dentro dos parâmetros bíblicos, e se não houver base comprovada de acordo com a Palavra de Deus, deve ser rejeitada, combatida e retirada de nosso meio, não importa quem a esteja pregando (Gl 1:7-9[1]).

Números 22:6 -Vem, pois, agora, rogo-te, amaldiçoa-me este povo, pois mais poderoso é do que eu; talvez o poderei ferir e lançar fora da terra; porque eu sei que, a quem tu abençoares será abençoado, e a quem tu amaldiçoares será amaldiçoado”. Do capítulo 22 ao 24 do livro de números,  um acontecimento em especial nos chama muito a atenção. A Bíblia não fornece muitas informações sobre a origem de Balaão, mas, ao que parece, ele não era um profeta escolhido por Deus e sim um pagão[2] ou talvez um profeta israelita que tivesse se desviado do verdadeiro caminho do Senhor; suas atitudes ambiciosas nos levam a pensar assim. O fato de ele ter sido procurado por Balaque, um rei moabita e inimigo de Israel, mostra que ele tinha uma certa moral no exercício profético. O pedido desse rei era que o profeta amaldiçoasse os israelitas, pois o mesmo sabia de seus êxitos em batalhas contra outros povos e temia ter o mesmo fim que eles. Então ofereceu recompensas financeiras para que por meio de palavras de maldição viesse a impedir o avanço do povo de Deus. Porém, o Senhor de fato falava com Balaão e o ordenou que abençoasse a Israel. Diante de tais ocorrências, se nota que a autoridade nas palavras proferidas por homens tidos como “instrumentos de Deus” era reconhecidamente aceita entre os povos, e a questão era tão séria que ele foi divinamente impedido de amaldiçoar; mas teria Jeová feito isso por que as palavras desse homem teriam realmente validade? A resposta mais pertinente aqui é que Ele quis mostrar seu soberano poder sobre o homem, assim provando que o povo de Israel estava sob sua proteção e bênção, pois independentemente de um profeta - ou suposto profeta - amaldiçoar ou abençoar alguém, o ser humano jamais terá autoridade acima da vontade ou propósitos divinos. Balaão ainda é citado negativamente no Novo Testamento em situações que se referem a pecados ligados a ganância (2ª Pe 2:15; Jd 1:11; Ap 2:14).

2º Samuel 12:7,10,11 -Então disse Natã[3] a Davi: Tu és este homem. Assim diz o Senhor Deus de Israel: Eu te ungi rei sobre Israel, e eu te livrei das mãos de Saul; 10Agora, pois, não se apartará a espada jamais da tua casa, porquanto me desprezaste, e tomaste a mulher de Urias, o heteu, para ser tua mulher. 11Assim diz o Senhor: Eis que suscitarei da tua própria casa o mal sobre ti, e tomarei tuas mulheres perante os teus olhos, e as darei a teu próximo, o qual se deitará com tuas mulheres perante este sol. 12Porque tu o fizeste em oculto, mas eu farei este negócio perante todo o Israel e perante o sol.”. Muito comum, até mesmo nos dias atuais, é as pessoas atribuírem as profecias aos profetas, como se os mesmos profetizassem por vontade própria. No entanto, observando por toda a Bíblia, vemos que aqueles que têm o dom de profecia nada mais fazem do que dizer o que Deus os ordenou e, as vezes, para cumprir essa missão, enfrentam até situações difíceis como, por exemplo, no caso de Natã. Ele tinha uma grande amizade com o rei Davi, porém Davi havia pecado gravemente - tinha cometido adultério e homicídio - e o Senhor mandou Natã repreendê-lo; então, com muita sabedoria, ele fez uso de uma parábola[4] e assim conseguiu entrar abertamente naquele embaraçoso assunto (2º Sm 12:1-6). Uma das consequências dos pecados de Davi seria a violência e a constante desarmonia em sua família. Então isso significa que o profeta o amaldiçoou proferindo o castigo divino? De maneira nenhuma! O que ele fez foi avisar o que a desobediência gerou para os seus descendentes, e tudo realmente se cumpriu posteriormente (2º Sm 12:15,19; 13:28[5] [6]; 16:21,22[7] [8]; 18:14,15[9]); porém, Davi reconheceu que, de fato, havia errado terrivelmente (2º Sm 12:13,14).

Marcos 11:14 -E Jesus, falando, disse à figueira: Nunca mais coma alguém fruto de ti. E os seus discípulos ouviram isto”. Essa lição de Jesus sobre os que vivem de aparência com suas “belas folhas”, mas, na verdade, não estão produzindo fruto algum, nos dão uma real visão sobre o poder das palavras para amaldiçoar. Não quero aqui enfatizar o motivo da maldição sobre a figueira, mas sim seu resultado imediato (Mc 11:20,21[10]); em seguida, Ele ensina que há autoridade nas palavras do homem, na mesma forma que para amaldiçoar, como também para abençoar (Mc 11:23,24); porém, a condição para isso é a fé (Mc 11:22), e a fé consiste na obediência e intimidade com o Senhor, e implica ainda em ser justo naquilo que diz, pois Deus não atenderá palavras lançadas por mera banalidade (Tg 4:3).

Atos 5:9 -Então Pedro lhe disse: Por que é que entre vós vos concertastes para tentar o Espírito do Senhor? Eis aí à porta os pés dos que sepultaram o teu marido, e também te levarão a ti”. Teria Pedro amaldiçoado Ananias e Safira no momento em que descobriu sua mentira? Analisando todo o texto, podemos ver que o que lhes aconteceu foi simplesmente consequência por terem tentado enganar os homens de Deus, pois, a partir do momento que se faz algo contra a Igreja, a briga do indivíduo não é contra os irmãos e sim contra o próprio Deus (At 5:4; 9:4; 5:38,39).  Pedro nada mais fez do que relatar o que o Senhor o havia revelado e proferir a sentença que veio do Alto; pode-se dizer que foi uma legítima demonstração de discernimento espiritual seguida de um espantoso milagre que causou morte instantânea em ambos os pecadores; o fruto disso para a Igreja não foi o prazer da vingança contra quem mentia para eles, mas sim o grande temor que certamente lhes fortaleceu a fé e mostrou aos perseguidores que o Deus de Israel estava com os cristãos.

1ª Coríntios 5:5 -Seja, este tal, entregue a Satanás para destruição da carne, para que o espírito seja salvo no dia do Senhor Jesus”. O que Paulo quis dizer com isso? Ele amaldiçoou esse jovem que estava em adultério? Interpretando o texto de forma racional conseguimos entender que tal afirmação nada tem a ver com maldição, pois o que ele fez foi simplesmente deixa-lo ir viver a ilusão do pecado, na esperança de que o mesmo, após enfrentar as consequências de seus erros, futuramente se arrependesse e voltasse ao caminho do Senhor. A maior preocupação dele, nessa situação, era em corrigir a Igreja que parecia consentir com o erro não repreendendo o pecador; dessa forma, ele nos ensina a importância da disciplina (1ª Tm 5:19,20; Mt 18:15-18) para não sermos coniventes com o pecado e nem vítimas passivas de injustiça entre os irmãos.

1ª Timóteo 1:20 -E entre esses foram Himeneu e Alexandre[11], os quais entreguei a Satanás, para que aprendam a não blasfemar”. Da mesma forma aqui, ele ensina que não se deve tolerar o pecado, nem que isso esteja sendo praticado por obreiros ou líderes da Igreja. Ao tomar a atitude de deixar de lado dois irmãos que além de pecar causavam dissensão (2ª Tm 2:14-18[12]), estava ele poupando todos os demais de conviverem com situações ilícitas e correndo o risco de serem por esses contaminados e não amaldiçoando num momento de ira como pode parecer sem uma análise mais profunda. Contendas ministeriais são bastante comuns nos dias atuais e até inevitáveis; porém, devemos cuidar que as mesmas não nos tornem hereges e inimigos da cruz de Cristo (Fp 3:18-21).

De acordo com o que vimos nas Escrituras Sagradas nem tudo é maldição, pois muitas das declarações de homens cheios de autoridade espiritual, nada mais foram do que afirmações de sentenças dadas pelo próprio Deus sobre o pecado humano. Poderíamos ainda mencionar casos bem conhecidos como a maldição de Noé sobre Canaã ou de Eliseu sobre Geazi, mas nada diferente acrescentaríamos ao que já tem sido falado. De fato, existe sim poder dado ao homem para amaldiçoar e abençoar (Tg 3:5-10), mas é preciso lembrarmos sempre duas coisas: a primeira é que para se ter autoridade nas palavras é preciso muita comunhão com Deus e a segunda é que Ele está no controle de tudo e nada acontecerá sem a sua permissão.

Como vimos na Bíblia, cada fato teve sua razão específica diante de cada resultado. Assim, concluímos então que boa parte da crença atual no poder das palavras é, na realidade, mera superstição: crédito à fantasias e mitos. Medo de que palavras negativas atraiam coisas ruins, e esperança de que palavras positivas atraiam coisas boas não representam prudência e nem fé, ou seja, repreender o que te desagrada e “profetizar” o que te convém não surte efeito algum, porque o que de fato faz a diferença em nossa vida é a obediência, a qual também pode ser definida como santificação (Hb 12:14). Resumindo, o que de fato faz diferença são atitudes negativas ou positivas e, principalmente, a comunhão com Deus fazendo a vontade dEle; e fazer a vontade dEle consiste em amar, perdoar e desejar o bem mesmo daqueles que querem o nosso mal (Rm 12:14).

Pesquisas, Texto e Edição: Pb. Jonas M. Olímpio

[1]Anátema: Maldição, reprovação: lançar o anátema sobre alguém. Pessoa anatematizada, excomungada.

[2]Pagão: Relativo ao paganismo ou politeísmo. Adepto do paganismo. Diz-se de toda religião ou pessoa que não seja cristã nem judaica. Maometano, em relação aos cristãos, e herético, em relação aos católicos. Animal xucro, ainda não montado, ou nos primeiros galopes da doma. O que segue uma religião nativa, não cristã nem judaica, caracterizada pelo politeísmo e pela superstição. Pessoa não batizada.

[3]Natã: Em hebraico significa "Presente". Filho de Atai; foi um profeta que viveu durante o período do reinado de Davi e de Salomão em Israel.

[4]Parábola: Origináda do grego parabole, significa narrativa curta ou apólogo, muitas vezes erroneamente definida também como fábula. Sua característica é ser protagonizada por seres humanos e possuir sempre uma razão moral que pode ser tanto implícita como explícita. Ao longo dos tempos vem sendo utilizada para ilustrar lições de ética por vias simbólicas ou indiretas. Narração figurativa na qual, por meio de comparação, o conjunto dos elementos evoca outras realidades, tanto fantásticas, quando reais. Eram as histórias geralmente extraídas da vida cotidiana utilizadas por Jesus Cristo para ensinar aos seus discípulos. Segundo Marcos 4:11-12, eram utilizadas por Jesus para que somente seus discípulos as entendessem plenamente. Este gênero já era utilizado por muitos dos antigos profetas. Na Bíblia, encontramos 50 parábolas; dessas, 40 foram contadas por Jesus.

[5]Absalão: Significa “Pai de Paz”. Terceiro filho de Davi. Tornou-se inimigo do pai tentando se apossar de seu trono. Foi morto por Joabe (2º Sm 13:1-18:33).

[6]Amnom: Significa “Fiel”. Filho primogênito de Davi. Praticou incesto e foi morto por Absalão (2º Sm 13:1-39).

[7]Aitofel: Foi conselheiro pessoal do rei Davi. O Talmude, supõe que ele seja o traidor mencionado por Davi no Salmo 55.

[8]Concubina: Na era dos patriarcas não é muito clara a diferença entre esposa e concubina, porque era comum a poligamia. Na verdade, a concubina, geralmente, era uma escrava.

[9]Joabe: Significa "Javé É Pai". Filho de Zeruia, meia-irmã de Davi (2º Sm 2:18). Foi comandante do exército de Davi (1º Cr 11:4-9) e conseguiu muitas vitórias (2º Sm cap. 10; 12:26). Tramou o assassinato de Urias (2º Sm cap. 11) e matou Absalão (2º Sm 18:9-15). Quando Davi já era velho, Joabe aliou-se com Adonias e foi morto por ordem de Salomão (1º Rs 1:1-8; 2:28-34).

[10]Pedro: Significa "Pedra". Apóstolo (Mc 3:13-19), também chamado de Simão e Cefas (Jo 1:42). Era pescador (Mc 1:16). Episódios de sua vida são mencionados em (Mc 1:16-18; Lc 5:1-11; 8:40-56; Mt 8:14-15; 14:28-33; 16:13-23; 17:1-13; 26:36-46,69-75; Lc 24:34; Jo 18:10-18,25-27; 21:1-23; At 1:13-5:42; 8:14-25; 10:1-11:18; 12:1-19; 15:1-11; 1ª Co 9:5; Gl 1:18; 2:6-14). Segundo a tradição, foi morto entre 64 e 67 dC., no tempo do imperador Nero. Foi autor de duas epístolas no Novo Testamento.

[11]Alexandre e Himeneu: A Bíblia não dá detalhes sobre ele, mas, segundo a história, ele teria se esforçado para prejudicar o apóstolo Paulo perante a justiça romana na cidade de Éfeso. Em 1ª Timóteo 1:19,29 ele é citado junto com Himeneu como alguém que rejeitou a fé e foi entregue a Satanás pelo apóstolo para aprender a não blasfemar. Em 2ª Timóteo 4:14,15, Paulo novamente menciona-o afirmando que ele lhe causou muitos males e aconselha Timóteo a ter cuidado com ele. Latoeiro é o nome da profissão de quem trabalha com metais: é o mesmo que funileiro; devido a sua função e a idolatria aos deuses pagãos existentes em Éfeso, certamente ele fazia imagens de escultura e, por essa razão, combateu os pregadores do Evangelho.

[12]Fileto: Significa "O Amado". Mencionado em 2ª Timóteo 2:17 juntamente com Himeneu, Paulo declara que o menciona como sendo um dos causadores de contenda e propagação de heresia na Igreja.

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